Para
abordar o tema importa saber primeiramente o que entender por poder discricionário,
este começou por ser entendido como um poder livre ou até mesmo arbitrário onde
simplesmente não tinha de contrariar a lei. Hoje o poder discricionário é atribuído
por lei tendo a mesma como fundamento. As razões para a existência deste poder são
várias. Entre elas, permitir a melhor resolução dos casos concretos, o seu exercício
aumentar a responsabilidade da administração e o facto de ser uma necessidade
pois a lei não consegue controlar todos os aspectos, como por exemplo estipular
“quem serão os melhores governadores civis para cada distrito”, como nos refere
o professor Diogo Freitas do Amaral (isto sem prejuízo da extinção do cargo de
governador civil nos tempos hodiernos).
Como
foi supra mencionado, nos dias de hoje, este poder não é arbitrário tendo por
isso vários limites como princípios (designadamente igualdade,
proporcionalidade, imparcialidade, entre outros), as leis e até mesmo os
regulamentos estando nestes últimos em causa um fenómeno de auto vinculação cuja
sua violação irá originar uma ilegalidade (princípio da inderrogabilidade
singular dos regulamentos). Deve contudo ser referido que em nenhum ato tudo é discricionário
nem tudo é vinculado, existindo sempre um misto dos dois, sendo conveniente falarmos
em atos predominantemente vinculados e atos predominantemente discricionários pois
num ato a competência e o fim são sempre vinculados mas o momento, a fundamentação,
a forma e ate mesmo o conteúdo podem ser discricionários, daí, com mais
discricionariedade ou mais vinculação o ato acaba por conter sempre algo das
duas figuras não sendo totalmente abrangido por nenhuma.
Com
isto aparece a discricionariedade imprópria, algo que alguma doutrina considera
como uma “falsa” discricionariedade. Dentro desta categoria estão incluídas a
liberdade probatória, a discricionariedade técnica e a justiça burocrática. A
liberdade probatória é quando a administração tem a liberdade de, em relação aos
factos que servirão de meio de prova, analisar e interpretar os mesmos. A
discricionariedade técnica é quando a administração precisa de estudos de
natureza técnica para chegar à solução (exemplo: local para a construção de uma
barragem). Por último, a justiça burocrática ou administrativa, onde a
administração tem de avaliar pessoas ou comportamentos (exemplo: avaliar
alunos). Nestes três casos alguns autores, nomeadamente o professor Freitas do
Amaral, o professor Jorge Rodrigues Simão, entre outros defendem que não existe
uma verdadeira discricionariedade uma vez que não existe um poder de escolha
mas sim a “obrigação de escolher a solução mais acertada”. Assim sendo na justiça
burocrática, por exemplo, o professor não tem um poder discricionário ao dar a
nota mas sim a obrigação de apurar a única solução correta.
Não
parece, contudo, a solução mais adequada pois nas três situações acima referidas
de discricionariedade imprópria não parece existir apenas uma solução
acertada
mas várias dentro de um certo parâmetro. Assim sendo, na discricionariedade técnica,
em muitos casos, colocar uma barragem ou uma ponte num local ou alguns metros
mais ao lado vai ser exactamente igual e as duas soluções vão estar adequadas
ao pretendido ou então na justiça burocrática, um aluno ser avaliado em 12.1
por um professor e outro professor avaliar o mesmo aluno em 12.3, as duas notas
vão estar certas provando novamente que não existe apenas uma única solução possível.
Por último, na liberdade probatória, numa “avaliação de um imóvel para efeitos
de liquidação de um imposto sobre o património”, será que o mesmo imóvel avaliado
por dois profissionais distintos não poderá ter valores diferentes mas ambos
adequados?
Concluindo,
parece que em nenhum dos três casos de discricionariedade imprópria existe uma
só solução acertada o que leva a crer que tanto a liberdade probatória, a
justiça burocrática e a discricionariedade técnica são exemplos típicos de
discricionariedade. Esta como um espaço de liberdade da “administração para
determinar ela própria as escolhas a fazer” não fazendo sentido a qualificação
de “impropria”.
Nuno Rodrigues, nº 25774
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